Chegamos
na casa dela, e enquanto acendia a luz e batia a porta, Ana despejou um pesado
suspiro sobre o assoalho marrom. Disse que ia tomar banho. Eu bebi qualquer
coisa da geladeira, tirei a calça e os sapatos e deitei na cama sob a janela.
Alguns
minutos depois ela veio, e eu fingindo dormir, senti o cheiro feliz da mistura
do seu xampu com o sabonete, algo de frutas que lembrava o cor-de-rosa. A mesma
Ana desligou as luzes e subiu, mãos e joelhos, para se largar por cima do
cobertor. Eu, ainda de olhos fechados, cerquei ela com meu braço e posicionei meu
nariz entre seus cabelos úmidos e a pele, fresca mas pulsante. E inalei bem
fundo um jato de flores e uma lembrança de água quente. Corri a mão por suas
costas, as curvas e dobras, depressão e vale debaixo dos meus dedos, e
desembaracei uma mecha caída do seu cabelo no escuro, gelado, imprudente.
Arranjei melhor seu corpo molengo de sono e pesado de entrega ao estado
semi-consciente sobre o meu próprio, não muito distante disso, mas ainda um
pouco responsável, de modo à sua pele ficar quase livre do molhado.
Pisquei
mais umas duas vezes e pensei, mal e mal, sobre o por que do meu sorriso
desapercebido, aparentemente imotivado, ainda mais quando uma de suas pernas
adormecidas se jogou sobre as minhas (decididamente imprudente). O neon clichê
da placa do outro lado da rua jogava raios vermelhos sobre o pequeno
quarto-cozinha. E eu fechei os olhos seguindo o caminho de Ana, ignorando as
possíveis perguntas que, como todas que eram importantes, eu ia morrer sem
responder.
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