A primeira vez que vi Emília,
Ela me pareceu como todas as
outras:
Uma boneca, pálida, metida
E a primeira vez que ela me viu,
me achou assustador:
Grande, cabeludo, uma besta.
A segunda vez que vi Emília, foi
nas conversas dos meus amigos:
Durona, engraçada, infantil
E aí ela começou a ser bonita de
outra maneira
A segunda vez que ela me viu, foi
além da pele
E desde então ela sorriu.
Na terceira vez, nos vimos
juntos:
Palavras, gostos, favores
E na quarta, uma blusa de banda,
dois livros, uma piada
Depois da quinta vez, eu perdi a
conta
Porque na quinta é quando tudo
desaba
Foi quando eu vi que estava sem
coração
E ela descobriu que eu a queria
debaixo da pele
Junto de cada osso
Na raiz de cada dente,
Apesar de tudo.
E eu vi como ela me queria:
Toda vez que ela não me olhava
Toda vez que ela não sorria
Toda vez que aquele lábio tremia
E em todas as palavras que ela
não dizia
Então, nos vimos como num
espelho:
Um anjo e um demônio
Na unha de cada dedo
Um desejo manchando um sonho
No meio dos seus seios
A minha cabeça rolando
Pra longe do corpo
Pra longe
E eu descobri que a odiava
Assim que fechei os olhos.