Crônicas de uma Exploradora do Invisível.

sexta-feira, 16 de janeiro de 2015

Caso de polícia

Eu amo a vida.
Eu amo a vida como um marido ama a mulher que espanca dia sim, dia não. Eu amo tê-la em minhas mãos pesadas e fazê-la voar de encontro à parede do outro lado da sala. Eu amo amarrá-la ao cano da pia da cozinha para ter certeza de onde ficou a minha vida enquanto saio para trabalhar. Eu amo o gosto pálido do seu sangue quando beijo os seus lábios inchados, e quando ela beija meus punhos sujos, eu me sinto completo. Ela está em mim por inteiro.
Eu amo a vida de olhos roxos que deixo trancada em nossas quatro paredes. Eu sei que ela é só minha e sei exatamente o quanto é frágil.
E fui assim até um certo dia em que passei pela porta de uma igreja, e depois por uma praça coalhada de mendigos, e desci do meu ônibus lotado de zumbis. Fui assim até deparar com a minha própria contradição:
Pelo Amor de Deus. Isso não é amor.