Crônicas de uma Exploradora do Invisível.

sexta-feira, 27 de abril de 2012

Carnívoros

            Não pense que eu sou boa, uma mocinha narrando a história, de cabelos e autoestima embaraçados. Uma mocinha em Ação de Graças. Eu não, não sou. Não ao cubo e agora: não se engane comigo, meu filho.
            Eu engordei meu amor como uma ave para o abate. Alimentei tuas esperanças, te fiz grande e rosado, cor de rosa como o amor que cabe a uma mocinha. Eu te fundei, te instituí, te cultivei, até te ninei enquanto cabia nos braços, enquanto cabia nos olhos. Mas até dos meus olhos tortos o amor se arrebentou, feito uma nota aguda que se sustém, mas morre: De repente. Meu amor que criei, foi pingando pra fora... Não pense que é livre, lindo que me rodeia. Eu te fiz só ter olhos pra mim, te fiz, teus olhos pra mim. Eu te previ, te pintei com minhas cores, vê a mim, desbotada, abatida? Essa sombra que te faz cintilar é minha. Eu te criei até estar pesado, difícil, impossível de esconder. Eu te criei até ser.
            Eu engordei meu amor pro abate, claro, como poderia se consumar sem sangue? Meu amor, engordurado, cheio de penas e eu, de lágrima. Não será insosso não, nosso filho. E eu que te segui, que me enrolei no seu cheiro, que arrastei os pés e cisquei nesses cílios enormes, nesses olhos de gente, nesse coração que te arrufa, redondo... Eu me sinto tonto.
            Não pense que sou boa, eu tenho a faca, tenho sim... eu, eu, sempre, comando a ação-narrativa. Eu que te criei, amor do meu dia (de graça!...), eu em ciscar fiquei tonta, tonta... Como uma ave decepada.