Crônicas de uma Exploradora do Invisível.

sexta-feira, 18 de novembro de 2011

Tablóide


            Passei por uma flor vermelha no chão e noite passada desabou tempestade. A filha da primavera não resistiu. Caiu e sangrou. A manhã veio, mas foi manhã tarde demais. A pequena jazia sobre o chão, escuro asfalto molhado, colorindo pequeno perímetro de encarnado. Mas engraçado foi o que fizeram ao redor. Como em acidentes traçam o contorno do corpo no chão, assim fizeram em volta da pequena flora. Um círculo, menor que de bola de gude, grosso, também vermelho. Quase pensei que fosse o sangue da flor, mas passei bem perto e vi que não. Haviam se preocupado em traçar a área do crime, ainda que a tentativa de investigação viesse cheia de furos. Primeiro que não removeram o corpinho para autópsia – embora a causa mortis fosse evidente, e então, passível de investigação: que a morte da flor foi causada pela tempestade que a própria natureza, que favorecera seu nascimento, outorgou. O Senhor dá e o Senhor tira. E depois deixaram tudo lá, à espera: de testemunhas, de mim e meu relato fútil e esquecível, do Sol. Desconfio que queriam mais que o círculo no chão; queriam um círculo vicioso, uma prova do amor do pai, o Provedor de Clorofila. Quando ele a notar, caída e avermelhada, vai se recolher novamente (e nós já sentimos tanto sua falta) e a mater chuva voltará, desta vez velando a filhinha transformada em manchete sensacionalista de blog às sextas-feiras, e lhe tocará com a ponta dos pingos e lhe molhará as pétalas secas de beijos muito dignos. E a envolverá docemente, como se substituísse o sumo vermelho vertido e a transportará para além do círculo desenhado e no ciclo que mistura água, carbono e nitrogênio será novamente integrada em única coisa que sempre foi, até mesmo agora, morta: ciclo da vida.

Um comentário:

  1. Amanda, vi seu comentário lá no meu blog.
    Sinta-se a vontade :)

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